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domingo, 12 de maio de 2019

Como tudo começou - Parte II

O INTERNAMENTO NA ESTEFÂNIA

Chegámos à urgência daquele hospital no dia 02 de Abril pelas 19h. 

Rapidamente fomos chamadas à triagem, levei a Matilde em braços, tal era a prostração e o cansaço. Fomos recebidas pelo (GRANDE) Enf. Luís, que assim que nos viu franziu o sobrolho. Não me perguntei porque, mas senti naquele exacto momento que a Matilde estava entregue, que finalmente alguém iria olhar para ela com olhos de ver, que seria valorizada e diagnosticada. Ainda não tinha aberto a boca e a dúvida já se tinha instalado.

Sentei-me com ela deitada no meu colo e o Enf. Luís, ainda antes de me perguntar o que quer que seja, levantou-se e foi buscar o kit da glicémia. Tudo normal. Disse-me que hoje em dia entram várias crianças com diabetes nas urgências, claramente e pelos valores não era o caso da Matilde. Viu a febre, e a Matilde tinha quase 38º. Começou à procura de outro tipo de sinais no corpo, viu as costas, a barriga e as pernas pormenorizadamente. Tudo normal. A seguir sentou-se ao meu lado e disse-me que era ele que iria fazer as perguntas, e começou. Respondi a tudo e ele apenas me disse que a minha filha não estava bem, iria ser vista e diagnosticada, que provavelmente precisaria de análises para despistar a palidez extrema que apresentava e depois logo se veria, mas que bem ela não estava.

Foi-nos buscar uma cadeira de rodas e encaminhou-nos para uma sala à parte daquela com pulseira amarela, disse que seríamos vistas com brevidade. 

Pouco depois fomos chamadas à médica, era nova, mas segundo o Enf. Luís, uma das melhores da classe dela e com olho para a coisa. Entrámos ainda mais confiantes naquele consultório e mais uma vez explicámos todo o nosso percurso até ali, e acrescentámos um sintoma novo que havia aparecido no dia anterior, por isso não o valorizamos muito, a Matilde coxeava da perna esquerda, dizia que lhe doía muito. Nesse dia levamos as análises que continham alterações e a médica mais uma vez disse que eram normais aquelas alterações e que a única coisa sintomática que a Matilde tinha era a febre, para a qual iria ser medicada com paracetamol e baixando, iria para casa. Questionei a palidez, a perda de peso, as dores de barriga, evoquei tudo e a resposta foi a mesma mais uma vez: não há critérios. Mas contrariamente ao suposto eu tinha o meu coração tranquilo, sabia existir um Enf. naquele hospital que estava connosco e isso iria encaminhar-nos para que a Matilde fosse diagnosticada. 

Saímos do consultório e tinha o Enf. Luís no corredor, questionou se a médica tinha pedido análises e não susteve o espanto quando lhe respondi que não. Disse-me que deveria de insistir. Acenei-lhe e voltei à sala de espera para aguardar a resposta da febre ao paracetamol. O Pai Miguel perguntou o que lhe tinha sido feito e ao dizer-lhe, exaltou-se e começou a dizer para irmos embora, que ali não iam fazer nada, que deveríamos procurar outras soluções. Acalmei-o e disse-lhe que sabia o que fazia e para esperarmos. 

Passado uns longos minutos, fomos novamente chamadas. A febre tinha cedido e iríamos  ser despachadas para casa. Pensou a médica, mas enganou-se! Disse-lhe que não estava confortável em levar a minha filha para casa naquele estado e perante a palidez dela, se era possível realizar novas análises para ver se a hemoglobina tinha descido ainda mais. Disse-me que não. Continuei a argumentar que talvez seria melhor, dado que conheço bem a minha filha e que ela não é assim (estava sentada numa cadeira de rodas a olhar para a médica e estava mais branca que cal), continuou a médica a argumentar comigo e eu com ela, até que me apontou o dedo e disse que ia pedir as análises, mas que já nao seria ela a visualiza-las, mas sim a outra médica que entrasse de serviço. Sorri e agradeci. Sei que no fundo ela não esperava este desfecho e eu iria adorar dar-lhe a razão toda, mas não.

Aguardamos mais de 1h na sala de espera para que a Matilde fosse chamada para as análises, quando nos informaram que as análises são realizadas no laboratório no Piso 1. Fula da vida, foi como me senti. Fizemos as análises e enquanto esperávamos os resultados, os meus sogros sempre prestáveis vieram trazer-nos  os carregadores dos telemóveis, comida e vieram buscar o Duarte para que ele fosse para casa deles descansar. Já era perto das 23h.

Perto das 24h fomos chamados à tal 'nova' médica que tinha assumido o turno seguinte e ela informou-nos que a Matilde tinha uma anemia bastante significativa, 8,4 de hemoglobina quando há 15d atrás tinha 10,5 e que teriam que perceber o que se passava. Iriam enviar sangue dela para o Hospital de São José para que fosse realizado um exame especifico, se desse positivo tinha que ficar já internada, se não teria que voltar na manhã seguinte para estudo da anemia em internamento. 

Ok, pensei eu, afinal tive razão em pedir análises, afinal ela tem uma anemia. Ok. Vamos lá curar isto. 

Falámos também na questão da perna e do coxear, pelo que passados uns minutos a ortopedista chamou-nos e observou a Matilde, após umas manobras de rodar as ancas, mandou-a correr no corredor e viu o seu mancar. Mandou-nos ir fazer um raio-x. Assim fizemos. 

Já seriam talvez perto das 02 da manhã quando a médica nos chamou novamente. A análise tinha vindo negativa e o raio-x estava bem, mas algo não batia certo com a Matilde, pelo que tinha que ser estudada com brevidade. Questionou-me se queria ficar já em SO (serviço de observação) e de manhã começavam os estudos ou preferia ir a casa e voltar na manhã seguinte. Expliquei-lhe que tenho outro filho pequeno e que ele estava com os avós, pensado que a irmã iria regressar a casa. Tinha que ir a casa explicar-lhe que talvez ficasse uns dias com a mana no hospital para que ele não ficasse ansioso. Gosto de lhes explicar tudo direitinho! 

A médica concordou e mandou-nos voltar no dia seguinte até às 10h. Escreveu uma carta com o caso da Matilde. Fomos buscar o nosso mano e fomos dormir com a incerteza do que estaria ainda para vir, mas sem muito stress, afinal era uma anemia que iria ser tratada rapidamente, pois iriam descobrir o que originava a perda de sangue. Ingénua, é o que a Marta de hoje chama a Marta daqueles tempos, muito ingénua!!

No dia seguinte, as 10h15 lá estávamos nós a dar entrada no SUPed da Estefânia. Pulseira laranja, cadeira de rodas e em menos de 20m estávamos a entrar no gabinete de observação e a ser encaminhadas à eco. Pensava-se numa hemorragia interna como causa mais aguda desta anemia. A seguir fomos fazer análises. 

A ecografia foi feita por uma (muito pouquechinha) profissional, que colocou o ecógrafo em 4 lados da barriga da Matilde e 5 minutos (se tanto) depois me disse por estas palavras: "Daqui não leva nada Mãe, pode regressar à urgência". Uffffffff!!

Lá regressámos nós, cheias de esperança que se dali não era, iriam de certo encontrar a causa. Chegámos perto da hora de almoço e chamaram-nos. A anemia da Matilde tinha descido um pouco mais, pelo que iria ser internada para estudo daquela anemia estranha e galopante. 

Aguardamos a tarde toda por uma vaga num serviço qualquer daquele hospital, a avó Fátima veio almoçar connosco e a Tia Vanessa e o Avô Luís vieram trazer-nos o jantar e buscar o  carro do Avô que o Pai tinha trazido para vir ter connosco, dado que iria ficar internada. 

O melhor é que quem fez a nossa admissão no internamento e quem nos fez questão se nos levar ao nosso quarto foi o nosso querido Enf. Luís. Fez tarde nesse dia e cruzámos-nos de novo.

A Matilde ficou internada no serviço de adolescentes, o que ela A-DO-ROU e tinha um quarto de princesas só para ela, com uma pequena banheira e tudo! 

Na manhã seguinte conhecemos a nossa médica, a Dr.ª Joana e a nossa hematologista, a Dr.ª Paula Kjollerstorm, depois das apresentações disseram-nos que a Matilde tinha uma anemia hemolítica  e que seria necessário esclarecer a causa, iria fazer mais exames e fazer uma TAC as pernas para perceber se existia alguma infecção que causasse aquele distúrbio sanguíneo. 

Depois desse dia, a Matilde fez análises todos dos dias, excepto no fim de semana. Todos os dias a Dr.ª Joana nos vinha ver e pôr a par dos resultados das análises, a anemia cada vez mais acentuada, mas começava a revelar outras alterações. Na Sexta-Feira, 05 de Abril foi-nos explicado que a Matilde poderia ter uma osteomielite e explicaram do que se tratava. Ficámos com o coração nas mãos, se a TAC que ela realizou fosse positiva era esse o diagnóstico. Feliz ou infelizmente não foi esse o diagnóstico final.

Entretanto todos os exames sanguíneos que lhe faziam vinham negativos, para toda e qualquer patologia da especialidade hematológica. Pediam outros e vinham negativos. Os valores oscilavam. Nada era conclusivo na Matilde.

Passou-se o fim de semana e na segunda feira a Matilde tinha uma eco abdominal agendada, tinha-me sido dito que a primeira que fez não foi muito pormenorizada, pudera!!! E lá fomos nós na segunda feira cheias de esperança. Foi outra técnica que realizou o exame e a meio do exame apareceu mais uma que lhe deu continuidade. No fim, foi-nos dito que existiam uns gânglios e que era necessária uma TAC. Ficou marcada para o dia seguinte.

Descemos para a TAC na manhã seguinte e foi necessário administrar contraste para ver os fluxos urinários. Fez 3 TAC numa só: ao toráx, abdómen e pélvis. Portou-se estoicamente e não foi necessário anestesiar. Uma valente! Quando a TAC terminou, saímos directos para nova ecografia abdominal e por incrível que pareça a médica também lhe fez uma ao pescoço. Exactamente no mesmo sítio que ela se havia queixado anteriormente. Caíu-me tudo e disse à médica: "Não me diga, ainda há uns dias ela se queixava com dores no pescoço e eu pensava que era um torcicolo". A médica não me respondeu e pediu-me para pôr a Matilde novamente na TAC. OS meus níveis de preocupação aumentavam e desconfiança também, mas sempre longe, muito longe mesmo deste diagnóstico final. 

Informaram-me que os resultados iriam demorar bastante, porque foram feitos 3 exames e de muito completos. Concordei e subi ao internamento. Dei de almoço à Matilde, o Miguel chegou, almoçamos, lanchámos, e ainda ninguém se tinha dirigido a nós. Falei com a enfermeira e pedi que nos esclarecessem quando nos iriam dar uma resposta. Depois de falar com a médica a enfermeira disse-nos que na manhã seguinte a Dr.ª Joana viria falar connosco, tinha saído de banco e ainda não estava no hospital. 

Foi a noite mais ansiosa que tinha vivido até então. Tive pesadelos horríveis, senti-me mal. Foi muito pesada essa noite, mas amanheceu, mas as notícias que nos esperavam não seriam as melhores e o meu coração sempre soube disto, mais uma vez: eu não o quis ouvir. 

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